sábado, 3 de junho de 2017

ETICIDADE DIGITAL

Abaixo se utilizará de conceitos éticos tradicionais e modernos para transportar eles para os desafios da era digital. Nota-se que, assim como em outras áreas, a falta de educação básica é um dos problemas que redunda nos embates que saltam para a internet.

Crê-se que em breve será considerado como abandono intelectual não preparar os jovens para os novos desafios tecnológicos, especialmente a internet, considerando as redes sociais uma parte muito sensível disso. Inclusive é o que apregoa o próprio Marco Civil, Lei nº 12.965/2014, especialmente os artigos 24 e 26, do referido diploma legal.

Fatos reais da área digital ou cibernética já existem e surgirão que colocarão os pais e educadores na linha de frente de desafios do dia a dia, onde quase tudo é on-line. Temas ligados a aplicativos, internet das coisas, big data, drones e inteligência artificial – apenas para citar alguns exemplos – ainda muito evoluirão, desaguando em consequências e reflexos no que tange a intimidade, privacidade e tensões de direitos entre as partes envolvidas.

Desta maneira, criar uma mentalidade de ética digital é crucial! Ensinar aos jovens a criar uma reputação digital é elementar. Pois muitas empresas contratam considerando os perfis das pessoas nas redes sociais, antes e durante a contratação[1][2].

A partir de fevereiro de 2015 entrou em vigor a Lei nº 13.185, publicada em 06/11/15, que instituiu o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying). Seu artigo 4º instituiu as medidas preventivas e se conscientização a serem tomadas, a saber:

Art. 4o Constituem objetivos do Programa referido no caput do art. 1o:
I - prevenir e combater a prática da intimidação sistemática (bullying) em toda a sociedade;
II - capacitar docentes e equipes pedagógicas para a implementação das ações de discussão, prevenção, orientação e solução do problema;
III - implementar e disseminar campanhas de educação, conscientização e informação;
IV - instituir práticas de conduta e orientação de pais, familiares e responsáveis diante da identificação de vítimas e agressores;
V - dar assistência psicológica, social e jurídica às vítimas e aos agressores;
VI - integrar os meios de comunicação de massa com as escolas e a sociedade, como forma de identificação e conscientização do problema e forma de preveni-lo e combatê-lo;
VII - promover a cidadania, a capacidade empática e o respeito a terceiros, nos marcos de uma cultura de paz e tolerância mútua;
VIII - evitar, tanto quanto possível, a punição dos agressores, privilegiando mecanismos e instrumentos alternativos que promovam a efetiva responsabilização e a mudança de comportamento hostil;
IX - promover medidas de conscientização, prevenção e combate a todos os tipos de violência, com ênfase nas práticas recorrentes de intimidação sistemática (bullying), ou constrangimento físico e psicológico, cometidas por alunos, professores e outros profissionais integrantes de escola e de comunidade escolar.

Nessa levada, o homem é um ser ético. E a dignidade da pessoa humana sempre deve ser o centro das atenções. Com essa observação pontuaram Rocasolano e Silveira[3] (2010, página 35):

Pode-se afirmar, destarte, que o ser humano não se limita a viver uma vida casual e determinada apenas pelos processos naturais; o homem constrói a sua própria história, fruto das suas constantes decisões histórico-seletivas. Enfatiza-se a ideia do ser humano como ente que é e que deve ser, consciente dessa dignidade. É precisamente da autoconsciência acerca de sua dignidade que surge o conceito de pessoa, segundo o qual o homem não é homem apenas porque existe, mas pelo significado que adquire sua própria vida.
Do exposto podemos concluir que o conceito de homem oferecido por Miguel Reale orienta-nos para compreender sua condição de pessoa – que nos auxilia, por sua vez, a dimensionar a ideia de valor, porque a pessoa será definida como valor-fonte de todos os valores.
Devemos a Kant o reconhecimento de que o homem, enquanto homem – mesmo tomado como simples possibilidade de realizar-se na sociedade e no Estado –, já possui um valor infinito, condição de toda vida ética.

Interessante notar que, a ética está em total antagonismo com a corrupção. Um grande mal do país, arraigado fortemente em nossa cultura. Em 2009, já antevendo os escândalos da Lava Jato e correlatos, assim bem detalhou Lucca[4] (2009: página 364), fazendo referências a outro autor:

A verdade é que a chamada retórica do poder já enfastiou a todos. Ninguém suporta mais o descalabro ético da sociedade brasileira. A classe empresarial – diz-nos, com propriedade o escritor e empresário Mario Ernesto Humberg – possui a grande responsabilidade de liderar a mudança ética no País, mostrando que a “roda do futuro começa a girar de forma diferente”, e asseverando que alguns empresários “já estão sensibilizados para essa necessidade de adotar princípios éticos nos seus negócios e estão assumindo essa responsabilidade.”
E prossegue: “O fundamental é que cada um comece a mudança pelo micro-universo em que sua presença é determinante e os resultados são facilmente comprovados – ou não. Não basta fazer declarações genéricas ou dizer que os políticos, governantes ou fiscais são corruptos. Isso é, no geral, meia verdade, porque na maioria das vezes eles são a parte passiva do processo. Mesmo que tenha exigido, sua ação é receber a propina, o jabaculê, a comissão, o p.f., a caixinha. A parte ativa do processo é normalmente um dirigente empresarial – que dá o dinheiro, seja para vender produtos ou serviços aos governos, de simples guarda-chuvas a grandes barragens, para apoiar candidatos que defendam seus interesses, ou para esconder falcatruas.”

Especificamente sobre eticidade digital expuseram Freitas, Whitaker e Sacchi[5] (2006, página 16), deste modo:

A autora comenta também (WHITAKER, 2002a, p. 5) que todos os que têm nas empresas, à sua disposição, o instrumento da comunicação, no caso o computador ligado a uma rede, acham-se no direito de transmitir comunicados e informações. A ética é essencial nesse momento, em que cada integrante da empresa tem em suas mãos tão poderoso instrumento e com ele pode comunicar, informar e, em consequência, talvez inconscientemente formar ou deformar o caráter das pessoas.
Isso significa que as altas heranças das empresas devem estar empenhadas em se atualizar e assessorar-se para estabelecer um processo de comunicação em suas organizações, tendo em vista essa nova ordem instalada na sociedade atual, geradora de tantes inovações. Inovações não somente de ferramentas colocadas à disposição de todos (a informação, por exemplo, hoje não é privilégio de alguns, está disseminada por toda parte), mas também inovações provocadas na pessoa: em diretores, acionistas, colaboradores, concorrentes, fornecedores e clientes das empresas. Deve haver um esforço de aperfeiçoamento contínuo, estruturado pelas altas lideranças das empresas, direcionado a todos os seus stakeholders. Isso exige constante e permanente atenção com a conotação ética das atitudes das pessoas.

De um viés acurado se nota que, a eticidade digital auxiliária a resolução de dilemas, notadamente nas relações de consumo, no Facebook, como tratado por aqui. Duelando estarão o direito a manifestação do pensamento frente o respeito à reputação digital da empresa

Para ajudar a dirimir tal aparente conflito, traz-se a baila a hermenêutica jurídica, conforme bem fundamento por Ferraz Jr.[6] (1994, página 308):

Deste modo a hermenêutica possibilita uma espécie de neutralização dos conflitos sociais, ao projetá-los dimensão harmoniosa – o mundo do legislador racional – na qual, em tese, se tornam todos decidíveis. Ela não elimina, assim, as contradições, mas as torna suportáveis. Portanto, não as oculta propriamente, mas as disfarça, trazendo-as para o plano das suas conceptualizações. Repete-se, pois, na hermenêutica o que ocorre com a dogmática analítica (supra 4.4). Enquanto esta, porém, exerce sua função ao isolar o direito num sistema, o saber interpretativo conforma o sentido do comportamento social à luz da incidência normativa. Ela cria assim condições para a decisão. Mas não diz como deve ocorrer a decisão. Para isso existe um terceiro modelo dogmático que toma a própria decisão como seu objeto privilegiado.

A necessidade de educação digital já é uma realidade indesculpável! Urge que a sociedade de um modo geral e as corporações não descuidem disso, com urgência para ontem!




[3] SILVEIRA, Vladmir Oliveira da; e ROCASOLANO, Maria Mendez. Direitos humanos: conceitos, significados e funções. São Paulo: Saraiva, 2010. Página: 35.
[4] De LUCCA, Newton. Da ética geral à ética empresarial. São Paulo: Quartier Latin, 2009. Página 364.
[5] FREITAS, Lourdes Maria Silva; WHITAKER, Maria do Carmo; SACCHI, Mario Gaspar. Ética e internet: uma contribuição para as empresas. São Paulo: DVS Editora, 2006. Página: 16.
[6] FERRAZ JR., Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. São Paulo: Atlas, 1995. Página 308.

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