quinta-feira, 6 de setembro de 2018

O REGULAMENTO GERAL DE PROTEÇÃO DE DADOS EM NEGÓCIOS DIGITAIS EUROPEUS E REGULAMENTOS SIMILARES, NA AMÉRICA LATINA. IMPLICAÇÕES LEGAIS.


O Regulamento Geral sobre Proteção de Dados ou GDPR (General Data Protection Regulation), consolidando normas anteriores da Comunidade Europeia, configura um dos mais importantes marcos legais na atualidade, no que tange aos negócios digitais, impactando todos os relacionamentos empresariais que se deem com empresas da Comunidade Europeia ou que armazene dados das pessoas singulares que sejam cidadãos da referida comunidade. Valendo destacar que está em vigor desde maio, deste ano, o aludido nº 2016/679.

Antes de adentrar no assunto de fundo, importante distinguir os tipos de dados pessoais envolvidos (PECK, 2016, p. 485), conforme doutrina:

“Os pontos mais relevantes envolvem, primeiramente, a delimitação clara da distinção entre dados pessoais de natureza cadastral (ligados à identificação do indivíduo), dados sensíveis (relacionados às questões mais íntimas protegidas pela Constituição Federal como origem étnica, racial, a orientação política, sexual, as convicções religiosas, filosóficas e morais, os dados genéticos, e de saúde) e os dados anônimos ou anonimizados (cujo elemento de identificação foi removido ou está ausente).”

Desta forma, como se falará em nível mundial neste curto texto, além de se falar de intimidade e privacidade nas órbitas das legislações nacionais, ou seja, na garantia de direitos fundamentais no plano micro, mas quando se parte para o plano macro se está a tratar de direitos humanos, notadamente amparados em salvaguardar a dignidade da pessoa humana, em todas as suas dimensões, com a proteção dos seus dados.
Sobre o assunto, destacando a importância da harmonização do tratamento de dados com as liberdades e direitos fundamentais, pontou-se (CORRÊA; LOUREIRO, 2018, s/p):

“O Regulamento (UE) 2016/679, do Parlamento Europeu e do Conselho da União Europeia, conhecido como Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (GPDR), que entrou em vigor em maio, registra, expressamente, a importância fundamental da circulação de dados nas sociedades atuais, para as empresas, associações e entes públicos. Alerta, também, para o aumento exponencial do tratamento de dados pessoais, associado ao desenvolvimento das tecnologias de informação. E aponta para a necessidade de harmonizar a crescente utilidade e conveniência de tratamento desses dados com as liberdades e direitos fundamentais.”

O professor Masseno, a quem reputo ser uma das maiores autoridades mundiais em termos de proteção de dados pessoais, em material disponibilizado (s/d, s/p), elencou alguns elementares princípios de tratamento de dados, o que aqui interessa sobremaneira, como destacado:

“4 – os Princípios do Tratamento dos Dados:
são, apenas, explicitados e identificados (Art.º 5.º n.º 1) :
“licitude, lealdade e transparência” (a)
“limitação das finalidades” (b)
“minimização dos dados” (c)
“exatidão” (d)
“limitação da conservação” (e)
“integridade e confidencialidade” (f)
 estes Princípios não são só linhas orientadoras, pela sua positivização reforçada,articulando-se com as condições delicitude do tratamento (Art.º 6.º)”

Vale trazer à colação aqui um resumo coletado de um guia, da empresa Sage, maior empresa do mundo fornecedora de sistemas de gestão empresarial para pequenas e médias empresas (2017, p. 05), que destaca os direitos das pessoas singulares e sua sensibilização, historiando inicialmente com a Diretiva que vigorava antes do Regulamento, a saber:

“Os direitos das pessoas singulares e sua sensibilização
A legislação em vigor na UE sobre a proteção de dados (Diretiva 95/46/CE) confere às pessoas singulares direitos sobre os seus dados pessoais e descreve quais as informações que têm de lhes ser facultadas pelas empresas, designadamente acerca da finalidade a que esses dados pessoais se destinam. É frequente estas informações serem facultadas através de declarações ou notificações de privacidade disponibilizadas num site.
O RGPD expande significativamente o seu âmbito de aplicabilidade, estabelecendo direitos adicionais que têm de ser novamente comunicados às pessoas singulares. Em especial, as pessoas singulares têm de ser informadas de que têm os seguintes direitos (lista meramente indicativa):
1. apresentar uma queixa junto das autoridades de controlo, como a CNPD em Portugal;
2. retirar o consentimento para o tratamento dos respetivos dados pessoais (ver abaixo);
3. aceder aos respetivos dados pessoais, bem como solicitar a sua retificação ou eliminação (o “direito a ser esquecido”) às empresas ou a quaisquer terceiros que a eles tenham tido acesso;
4. ser informado da existência de qualquer tratamento automatizado de dados pessoais (incluindo a criação de perfis);
5. opor-se a certos tipos de tratamento, como marketing direto e decisões baseadas apenas no tratamento automatizado;
6. ser informado sobre o período de retenção dos dados pessoais;
7. ser informado sobre a identidade e contactos de qualquer Encarregado de Proteção de Dados (ver abaixo). Além disso, as pessoas singulares têm o direito de recorrer a organizações sem fins lucrativos para fazerem valer os seus direitos e interporem ações judiciais em seu nome, semelhantes às ações coletivas nos Estados Unidos.”

Sobre a obrigação das empresas notificarem as Autoridades Supervisoras, assim destacou Moreira (2017, s/p):

“Outra obrigação instituída na GDPR é a de que, frente a um evento de vazamento de dados, capaz de gerar risco às pessoas, a entidade/empresa responsável deverá, em até 72 horas contados da ciência deste fato, notificar a Autoridade Supervisora competente (cada Estado membro indicará uma autoridade para fiscalizar a aplicação da GDPR e receber esse tipo de comunicação). Da mesma forma, deverá notificar o quanto antes as próprias pessoas acerca desse acontecimento, mantendo uma comunicação transparente com as partes envolvidas.”

Sobre leis de proteção de dados pelo mundo, cumpre trazer a colação informações de Agência Brasil (VALENTE, 2018, s/p), compilando alguns países a título demonstrativo, como Estados Unidos, Chile e Argentina:

“(...) Os Estados Unidos também são referência mundial. Não pela existência de uma lei geral, mas pela legislação fragmentada. A Lei de Privacidade de Comunicação Eletrônica (ECPA, na sigla em inglês), de 1986, proíbe a interceptação de mensagens telefônicas ou eletrônicas (como e-mails) e garante a segurança de informações tanto durante a transmissão quanto no armazenamento, inclusive em computadores. (...)

(...) Diversos países têm legislações de proteção de dados na América Latina, como Chile, Argentina, Uruguai e Colômbia. A lei chilena, de 1999, limita o uso dos dados ao propósito informado no ato da coleta, com a exceção de registros tornados públicos. Ela garante aos titulares o direito a acessar as informações de posse de alguma empresa, corrigi-la ou eliminá-la se o armazenamento não respeitar as exigências da Lei ou o tratamento for concluído.
A lei prevê a responsabilização de empresas controladoras de dados em caso de prejuízos aos titulares, com sanções definidas pela Justiça. O texto estabelece algumas diferenças para o Poder Público, limitando o tratamento de dados ao previsto na lei e impedindo divulgação de informações sobre condenações depois de prescreverem. (...)

‘Na Argentina, a Lei de Proteção de Dados Pessoais foi aprovada em 2000. Ela regula bases de dados públicas e privadas, estabelecendo como princípio o uso limitado à finalidade para a qual foram obtidos. O tratamento está condicionado ao consentimento do titular, que deve ser livre, expresso e informado. Essa autorização não é exigida nos casos de bases públicas, no cumprimento de uma obrigação legal, no exercício de funções próprias do Estado e quando as informações se limitam a nome, identidade, profissão, data de nascimento e endereço.
As empresas são obrigadas a atualizar dados incompletos e errados. Não podem manter registros após o término da atividade para a qual foram coletados. Os entes responsáveis pelo tratamento também devem garantir o acesso dos titulares às suas informações. Mas é permitido o repasse de dados a terceiros desde que cumpram um “interesse legítimo” do ente que os estão cedendo. Já órgãos públicos têm regras especiais, como o direito de negar o acesso, a correção e a supressão das informações. Também há menos obrigações no caso de segurança nacional ou segurança pública.’”

No Brasil, na semana passada foi aprovada a Lei de Proteção de Dados, com a pendência de uma Agência Nacional de Proteção de Dados, destacando brevemente o portal Olhar Digital (GUSMÃO, 2018, s/p):

“Foi aprovada por Michel Temer, nesta terça-feira, o PLC 53/2018 que estabelece a lei geral de proteção de dados (LGPD) brasileira. Com a assinatura do presidente, as empresas que processam dados no Brasil terão 18 meses para se adaptar à lei. Mas você sabe o que muda com ela?
De forma resumida, a legislação nacional vai exigir que as companhias mudem a forma como lidam com as informações de seus usuários. "A LGPD estabelece três figuras principais durante o tratamento de dados: o titular, o controlar e o operador", explicou Vanessa Lerner, advogado especialista em direito digital da Dias Carneiro Advogados. "Em sua essência, a lei não é nada mais do que um conjunto de direitos e obrigações dessas três partes em diferentes momentos, que gera uma rede capaz de proteger a privacidade e a autodeterminação dos titulares de dados pessoas no Brasil.
Patrícia Peck, também advogada especialista em direito digital, resumiu as mudanças: as companhias precisarão de consentimento das pessoas antes de poderem mexer com seus dados, terão que fazer de forma transparente e serão obrigadas a garantir a segurança de tudo que armazenam e processam.”

Assim, ter-se-á melhores subsídios para o enfrentamento de situações como o vazamento de dados enfrentados no mundo, como por exemplo, pela Uber, em 2016[1]. Ou o vazamento de dados Netshoes, no Brasil, em 2018[2]. O famoso ataque sofrido pela TARGET[3]. E o recente episódio do Facebook[4], com a Cambridge Analytica, com o superveniente pedido de falência desta e a perda de bilhões por aquela.
No Brasil temos duas situações curiosas em andamento.
A primeira, em que farmácias estão comercializando dados atrelados ao CPF de clientes (LUIZ, 2018, s/p), o que está sendo investigado pelo Ministério Público:

“O Ministério Público do Distrito Federal iniciou uma investigação para apurar se redes de farmácias do país estão repassando ou vendendo dados sigilosos de clientes, após exigir o CPF deles em troca de desconto. A suspeita é de que a lista de compra de cada consumidor esteja sendo divulgada para empresas de planos de saúde e de análise de crédito, em uma espécie de mercado paralelo.”

A segunda, quase foi leva a efeito, se não fosse a participação da Ordem dos Advogados do Brasil e órgãos de proteção ao consumidor (G1, 2018, s/p):

“O governador Márcio França (PSB) determinou a revogação da portaria da Imprensa Oficial que possibilitava empresas a se credenciarem para contratar o serviço de certificação online de identidade de indivíduos com base em dados biográficos e impressão digital. O Sistema de Dados Biométricos foi lançado em março durante a gestão de Geraldo Alckmin (PSDB).
Márcio França negou nesta quarta-feira (13) que o governo paulista faça a venda de informações sigilosas de identificação da população incluídas no cadastro do RG, como a digital, para empresas. Em entrevista em Santos, no entanto, o governador não descartou a possibilidade de o sistema ser usado por particulares.”

Como se nota, o Regulamento Geral de Proteção de Dados Europeu é um modelo que se espraiou e se espraia pelo mundo todo, inclusive com a exigência de que todas as empresas e países também se adaptem para que as relações mantidas com os países europeus se consolidem de modo legal.
Desta forma, os dados dos consumidores/cidadãos devem ser respeitados. Os dados devem ser salvaguardados, gerando-se diversas novas obrigações às empresas, como: escopo de aplicação, autorização para o tratamento de dados, o uso por determinado espaço de tempo, a correção e exclusão de dados quando solicitada rogada pela pessoa interessada, a imediata notificação obrigatória em caso de incidentes de segurança envolvendo dados e assim como outros importantes itens.
A novel Lei Brasileira – 13.709/18 – traz além de toda essa influência do RGPD, alguns itens que se entende como pilares da lei, quais sejam: a) criação de uma Autoridade Nacional para acompanhamento da aplicação da lei, ainda pendente; b) a obrigação de responsável legal dentro das corporações sobre os dados, inclusive com a gestão frente a empresas terceirizadas; c) multa de até 2% (dois por cento) do faturamento da pessoa jurídica no seu último exercício, limitada a R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais), por infração.
Com as rápidas mudanças tecnológicas as normas terão que ser atualizadas, eventualmente, de tempo em tempos, mas é importante que carreguem esse caráter principiológico que pode ter uma estrutura mais duradoura, com plena antevisão do porvir negocial.
Destarte, espera-se que, os países evoluam com a legislação específica, respeitando-se os dados das pessoas, bem como, a sua consequente dignidade da pessoa humana, respeitando-se as suas intimidades e privacidades, dentro do que se pode ser considerado razoável e proporcional.

Adriano Augusto Fidalgo. Advogado. Auditor Jurídico. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade São Francisco. Especialista em Direito Tributário pela Escola Superior de Advocacia da OAB/SP. MBA em Auditoria pela Universidade Nove de Julho. Presidente da Comissão Especial de Direito Digital e Compliance da OAB/Santana. Especialista em Computação Forense pela Universidade Mackenzie. Mestrando em Educação pela Universidade Nove de Julho, na Linha de Pesquisa: Educação, Filosofia e Formação Humana. Membro Efetivo da Comissão Especial de Educação Digital da OAB/SP. Membro Efetivo da Comissão Especial de Direito Digital e Compliance da OAB/SP. Membro das Comissões de Direito do Consumidor, CONSEG e OAB vai à Escola, da Subseção da OAB/Santana. Certificações em Tecnologia da Informação pela ITCERTS, do Canadá, nos cursos de Ethical Hacking Essentials, Information Security Policy Foundation e Infosec Foundation. Certificado pelas Academais do INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial) e World Intelectual Property Organization (WIPO) no Curso Geral de Propriedade Intelectual. Certificações em Fundamentos da Gestão de TI, Ética Empresarial, Processo de Comunicação e Comunicação Institucional, todos pela FGV. Articulista nos Portais TI Especialistas, Direito & TI, Profissionais TI, Yes Marília, Jurisway, Jusnavigandi e Administradores. Palestrante e Pesquisador.



REFERÊNCIAS

CÔRREA, Adriana Espíndola; LOUREIRO, Maria Fernanda Battaglin. Novo regulamento europeu é reforço na proteção dos dados pessoais? (Parte 1). CONJUR. Atualizado em: 09.Jul.2018. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2018-jul-09/direito-civil-atual-regulamento-europeu-ereforco-protecao-dados-pessoais. Acesso em: 18/08/18.

GUSMÃO, Gustavo. O que muda com a lei de proteção de dados brasileira aprovada por Temer. OLHAR DIGITAL. Atualizado em: 14.Ago.2018. Disponível em: https://olhardigital.com.br/pro/noticia/o-que-muda-com-a-lei-de-protecao-de-dados-brasileira-aprovada-por-temer/77329. Acesso em: 18/08/18.

G1. Governo de SP revoga portaria que possibilitava empresas contratarem serviço com dados da população. Atualizado em: 14.Jun.2018. Disponível em: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/governo-de-sp-revoga-portaria-que-possibilitava-empresas-contratarem-servico-com-dados-da-populacao.ghtml. Acesso em: 19/08/18.

LUIZ, Gabriel. CPF em troca de desconto: MP investiga venda de dados de clientes por farmácias. G1. Atualizado em: 16.Mar.2018. Disponível em: https://g1.globo.com/df/distrito-federal/noticia/cpf-em-troca-de-desconto-mp-investiga-venda-de-dados-de-clientes-por-farmacias.ghtml. Acesso em: 19/08/18.

MASSENO, Manuel David. Regulamento Geral sobre Proteção de Dados: alguns tópicos fundamentais. IBEJA. Sem data. Disponível em: http://ipbeja.academia.edu/ManuelDavidMasseno. Acesso em: 18/08/18.

MOREIRA, André de Oliveira Schenini. A lei de proteção de dados pessoais da União Europeia (GDPR) e sua aplicação extraterritorial às entidades e empresas brasileiras. MIGALHAS. Atualizado em: 24.Out.2017. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI267772,81042-A+lei+de+protecao+de+dados+pessoais+da+Uniao+Europeia+GDPR+e+sua. Acesso em: 19/08/18.

PINHEIRO, Patricia Peck. Direito Digital. 6ª Edição, São Paulo: Saraiva, 2016.

SAGE. Regulamento Geral sobre Proteção de Dados (RGPD): Guia prático da SAGE para empresas. 2017. Disponível em: https://www.sage.pt/~/media/markets/pt/rgpd/images/GuiaPratico_GDPR.pdf. Acesso em: 19/08/18.

VALENTE, Jonas. Legislação da proteção de dados já é uma realidade em outros países. AGÊNCIA BRASIL. Atualizado em: 07.Mai.2018. Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2018-05/legislacao-de-protecao-de-dados-ja-e-realidade-em-outros-paises. Acesso em: 19/08/18.


[3] Disponível em: https://meiobit.com/274508/hackers-roubam-dados-40-milhoes-cartoes-target/. Acesso em: 19/08/18.
[4] Disponível em: https://g1.globo.com/economia/tecnologia/noticia/cambridge-analytica-registra-pedido-de-falencia-nos-eua-apos-escandalo-com-facebook.ghtml. Acesso em: 19/08/18.

CIDADANIA ONLINE. COMUNICAÇÃO E MARKETING DIGITAL. CARACTERÍSTICAS E OBJETIVOS DO MARKETING DIGITAL. IMPLICAÇÕES LEGAIS.




O tema aqui trazido à discussão será dividido em duas partes.
Primeiramente se falará da questão da Cidadania Digital e, no segundo momento, sobre as questões do marketing digital e suas características e implicações legais como relatado no enunciado proposto.
A questão da Cidadania Digital ou Cybercidadania, também como dizem por aí, ela está intimamente ligada com outros itens, quais sejam: a educação digital e a ética digital. De modo que, todos têm o direito de se manifestar nas redes, expor suas opiniões, contudo tem que ser respeitado o direito alheio, dessa forma agindo assim com ética e neste exercício operando verdadeira educação digital.
Essa questão da Cidadania Digital é colocada à prova em alguns momentos, em situações de repercussão pública. Aqui no Brasil tivemos uma situação recente em que, sob o pretexto de ser acusado de furto de uma bicicleta, que na verdade não tinha sido furtada, porque o proprietário negou isso, um tatuador e um amigo, capturando o acusado, naquela oportunidade fizeram uma tatuagem na testa de um rapaz escrevendo os seguintes dizeres: “sou ladrão e vacilão”. Ou seja, como se ele assumisse o ilícito e o marcando na testa, de forma perene, ou seja, além da exposição digital deixando uma marca física assim como o nazismo fazia, por exemplo, assim decretando o que aqui chamamos também de morte digital ao indivíduo.
E essa situação depois chegou à Justiça, por onde os dois rapazes que cometeram o crime foram presos e estão respondendo criminalmente. E o jovem que teve a testa marcada era ainda, naquele momento, não tinha 18 anos de idade, de maneira que recebeu o amparo legal e até uma clínica de reabilitação assumiu o seu tratamento, pois ele usava drogas, era viciado. Alguns médicos se comprometeram a remover a tatuagem. Então vemos que o exercício arbitrário das próprias razões ainda acontece no mundo atual, isso pode ser transportado para a questão da comunicação e o marketing digital vendo o lado do consumidor que, por vezes, acha que pode atuar como um vingador nas redes sociais, com abuso de direito.
Mas antes de chegar ao lado do consumidor importante falar que, de um modo geral, o marketing digital é largamente utilizado no mundo inteiro e aqui no Brasil não é diferente, de modo que, estar bem localizado no Google, nos buscadores, afigura-se como fundamental para prosperidade de qualquer negócio e aí muita das vezes as próprias empresas travam grandes batalhas para que seus produtos fiquem melhores colocados, seja na busca paga, seja na orgânica, mas às vezes algumas até burlam o sistema, por exemplo, contratando anúncios pagos só que usando o nome da concorrente, uma palavra-chave da concorrente, como exemplo.
O que é vedado pela legislação, o Judiciário brasileiro entende como abusivo, pois isso viola direitos e determina a remoção do conteúdo. Isso gera a devida indenização pelo dano causado a empresa que teve seu nome ou a sua marca utilizada de forma abusiva e desleal pelo concorrente infrator.
Entende-se que o principal viés do tema solicitado é para tratar das relações entre consumidores e empresas, nota-se que algumas empresas abusam também quando exageram nos serviços de telemarketing bombardeando o consumidor com ligações infrutíferas, sem pedido prévio, o quê se entende até como um bullying telemático, em que o tempo útil do consumidor é gasto para responder ligações, que não levam a nada, sobre produtos que ele não solicitou, de modo que, fazendo-se prova de abuso cabe que ele seja até indenizado por tal propaganda abusiva, respondendo a empresa promotora sobre isso. O mesmo vale para e-mails, com condenações judiciais nesse sentido.
Desta maneira, observa-se que o marketing digital e a comunicação das empresas para com seus clientes, na oferta de seus produtos e serviços é fundamental, mas há de se delimitar até onde as empresas podem chegar, sem serem invasivas, com isso atacando a intimidade e a privacidade dos consumidores.
Geralmente quando se joga no Google alguma procura, por exemplo, de hotel para se hospedar, o consumidor é bombardeado, posteriormente, na sua timeline do Facebook ou no seu próprio e-mail de várias ofertas sobre aquele tipo de produto. Após o escândalo da Cambridge Analytica se confirmou, o que muitos já sabiam, ou seja, que o Facebook vende nossos dados para diversas empresas, onde o tratamento dos dados nem sempre respeita a legislação vigente ou detém um comportamento ético.
Um caso célebre, nessa questão envolvendo a intimidade e a privacidade dos consumidores se refere ao caso da empresa americana Target, em que um pai consumidor recebeu um cupom de desconto pelos correios, para comprar fraldas. Daí ele, sentindo-se ofendido foi lá até o hipermercado para reclamar com a atendente sobre aquilo, pois, não detinha nenhuma mulher com criança na família. A atendente então lhe pediu desculpas e tudo mais, mas ele retornando para o seu lar, no jantar, contou isso para a sua esposa e para a filha de 15 anos, que estava na mesa. Sendo que, neste ato, ela, a filha, confirmou que estava grávida, que estava acessando aquele tipo de produto, seja pelo Google, seja no site da própria empresa, o que gerou aquele cupom de desconto, de modo que, nota-se que, por vezes, esses canais digitais, esses bancos de dados – Big Data – sabem mais da nossa vida íntima e pessoal do que os próprios familiares, os esposos e esposas, companheiros e companheiras.
Na legislação brasileira se tem alguns direitos do consumidor garantidos, considerando que o nosso código é reputado como um dos melhores do mundo, que nos salvaguarda de situações de modo geral, sejam elas digitais ou não, desta forma vou citar alguns exemplos desses direitos que são garantidos: direito de arrependimento nas compras não presenciais, prazo de reclamações de 90 (noventa) dias para produtos duráveis e 30 (trinta) dias para produtos não duráveis, inversão do ônus da prova, reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo, foro privilegiado do consumidor, responsabilidade objetiva, responsabilidade solidária, prazo retificação do produto com vício, vinculação da informação e publicidade e vedação a prática abusiva.
Desta forma, ora voltando ao início do texto, como colocado, após se observar que o consumidor tem o direito de livre manifestação do pensamento, inclusive quanto às propagandas das empresas, que às vezes são até abusivas, por exemplo, quando envolvem produtos que são de interesse das crianças, assim forçando com que seus pais comprem lanches não tão saudáveis, atrelados àqueles brinquedos. O que é considerado aqui, até com intervenção do Ministério Público, por vezes, como venda casada e propaganda abusiva.
Mas uma pergunta frequente que se faz é até que ponto o consumidor pode se manifestar contra uma empresa, qual o limite dessa manifestação do pensamento, já que quando a empresa falha, seja na venda do produto, seja na prestação do serviço, seja por vício, mau funcionamento ou impropriedade do produto, falha na execução dos serviços e etc. a rede social, hoje em dia, é uma ferramenta poderosa também para ele(a) – consumudidor(a) – se manifestar criticando a atuação da empresa ou do profissional naquela situação específica, que pode inclusive levá-la a quebra por essa grande exposição, destruindo sua reputação digital, por vezes, o que redunda na reputação física, com reflexos no mundo palpável, afinal são a mesma coisa!
Por todo o exposto, em conclusão, verifica-se que as empresas podem se utilizar de alguns instrumentais tecnológicos para favorecer o seu marketing, para a promoção do seu produto, inclusive com suporte constitucional, senso lícito criar comunicações com seus consumidores, especialmente respeitando a livre iniciativa, a livre concorrência, que as empresas geram riquezas, geram empregos, de modo a fazer que a economia de um país se movimente, para angariar oportunidades, o Estado angariar tributos para manter em funcionamento a máquina estatal. Contudo, as empresas têm que observar os instrumentos de governança corporativa, de compliance, notadamente respeitando os direitos do consumidor, respeitando cada vez mais a proteção dos seus dados, de modo a harmonizar a sua atuação econômica e atuando com responsabilidade social, para que tenha sustentabilidade empresarial, para que se perpetue, dessa forma, tendo sempre como pedra de toque o respeito à dignidade da pessoa humana, seja dos seus consumidores, seja dos seus funcionários, dos seus colaboradores e dos seus parceiros comerciais.
Indico como suporte para tal temática os seguintes textos, disponíveis no site TI Especialistas:

Bullying Telemático: https://www.tiespecialistas.com.br/bullying-telematico/


Direito do consumidor e reputação digital: https://www.tiespecialistas.com.br/direito-do-consumidor-e-reputacao-digital/

 

Conar (conselho nacional de autorregulamentação publicitária): http://www.administradores.com.br/artigos/marketing/conar-conselho-nacional-de-autorregulamentacao-publicitaria/96875/


Compras pela internet e a não entrega do produto: https://www.tiespecialistas.com.br/compras-pela-internet-e-nao-entrega-do-produto/


Concorrência digital, buscadores e o judiciário: https://www.tiespecialistas.com.br/concorrencia-digital-buscadores-e-o-judiciario/



Educação Digital. Aspectos conceituais: https://www.tiespecialistas.com.br/educacao-digital-aspectos-conceituais/


Ética Digital: https://www.tiespecialistas.com.br/eticidade-digital/


Fake news e a cidadania digital: https://www.tiespecialistas.com.br/fake-news-e-a-cidadania-digital/

Promoções no Brasil. Cuidados nas redes sociais:

https://www.tiespecialistas.com.br/promocoes-no-brasil-cuidados-nas-redes-sociais/

Adriano Augusto Fidalgo. Advogado. Auditor Jurídico. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade São Francisco. Especialista em Direito Tributário pela Escola Superior de Advocacia da OAB/SP. MBA em Auditoria pela Universidade Nove de Julho. Presidente da Comissão Especial de Direito Digital e Compliance da OAB/Santana. Especialista em Computação Forense pela Universidade Mackenzie. Mestrando em Educação pela Universidade Nove de Julho, na Linha de Pesquisa: Educação, Filosofia e Formação Humana. Membro Efetivo da Comissão Especial de Educação Digital da OAB/SP. Membro Efetivo da Comissão Especial de Direito Digital e Compliance da OAB/SP. Membro das Comissões de Direito do Consumidor, CONSEG e OAB vai à Escola, da Subseção da OAB/Santana. Certificações em Tecnologia da Informação pela ITCERTS, do Canadá, nos cursos de Ethical Hacking Essentials, Information Security Policy Foundation e Infosec Foundation. Certificado pelas Academais do INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial) e World Intelectual Property Organization (WIPO) no Curso Geral de Propriedade Intelectual. Certificações em Fundamentos da Gestão de TI, Ética Empresarial, Processo de Comunicação e Comunicação Institucional, todos pela FGV. Articulista nos Portais TI Especialistas, Direito & TI, Profissionais TI, Yes Marília, Jurisway, Jusnavigandi e Administradores. Palestrante e Pesquisador.