Em
épocas eleitorais que notamos o quão falaciosos são os argumentos envolventes
dos políticos, especialmente os que buscam exaltar as fórmulas mágicas para um
problema que se eterniza: a má prestação de atendimento médico à população.
Considerando ser o Brasil um dos
países que detém a maior carga tributária do mundo, tudo isso traz consigo uma
fórmula perversa. Os países que não disponibilizam uma rede de saúde pública
pouco tributam, repassando tal encargo à iniciativa privada. Já as nações que
detêm mais tributos, ao contrário, oferecem ótimos serviços estatais de saúde.
Portanto, nosso país (Estado) aderiu à uma prática espúria, malévola e sem
sentido, já que mesmo praticando tributação excessiva nada reverte ao bem
comum.
Desta forma, pode-se deduzir que, um
dos motivos desta ineficácia estatal parece ser induzir as pessoas que tem “um
pouco mais de condições” a migrar para os planos de saúde privados. Mas o
problema não se resolve por aí, nos planos de saúde e seguro saúde também os
entraves acontecem. Vemos, por todos os lados, associados que tem
corriqueiramente uma cirurgia negada, um exame não atendido, tratamentos
interrompidos, falta de cobertura, alegações de descumprimento de carências, aumentos
exorbitantes pelas mudanças de faixa etária, enfim, inúmeros problemas, já que
a mercantilização da vida se mostra instaurada.
Sendo certo que, em tais e quais
casos, a obrigação é do Estado, tanto de bem prestar o seu serviço, inclusive com
o pagamento de medicamentos e tratamentos que não existam na sua rede pública aos
necessitados, ou, fiscalizar a qualidades dos serviços prestados pelos planos
de saúde, em um primeiro plano, por meio da ANS (Agência Nacional de Saúde) e,
de um modo geral, por todos desde que visualizados o desrespeito a lei ou, o
que é mais importante: o princípio da dignidade da pessoa humana.
O Estado Democrático de Direito
Brasileiro, em seu artigo 1°, inciso III, elenca como um de seus fundamentos a
dignidade da pessoa humana. Como prenunciou o saudoso jurista, professor Miguel
Reale, na sua famosa teoria tridimensional do direito, este se afigura composto
de fato, valor e norma. A dignidade da pessoa humana nascida de um princípio (fato),
embrenha-se no lato conceito de justo (valor), de maneira que, materializou-se
em lei (norma), tornando-se direito do cidadão e dever indescupável do Estado.
Antes de ser normatizado no Brasil,
o princípio da dignidade da pessoa humana remonta suas origens insculpidas no
Catecismo da Igreja Católica (Encíclicas como a Rerum Novarum, Quadragésimo Ano, Mater et Magistra, Populorum
Progressio e etc.), na sua doutrina social. Donde a pessoa, todo e qualquer
homem (ser humano), criatura de Deus, merece um tratamento digno, não degradante,
onde lhe sejam garantidas as mínimas condições de manutenção de sua condição
humana, ou seja, o requisito é ser humano, que tais prerrogativas lhe devem ser
natas, saltam do direito natural, merecendo apenas o legítimo reconhecimento e
aplicação.
Exatamente isso que vislumbramos
estar sendo todos os dias desrespeitado, ignorado e aniquilado nos hospitais do
Brasil. Nem mesmo os hospitais dos planos de saúde escapam às barbaridades que
resultam em tratamento desumano, rompendo com as premissas expostas. Renegando
as pessoas as garantias mínimas, as necessidades essenciais que, toda e
qualquer pessoa merece receber, notadamente quando a sua saúde está debilitava,
carecendo de uma atenção singular, ainda mais qualificada.
Assim, crentes de que todos os que
falham nesta engrenagem (políticos, empresários, médicos, atendentes,
profissionais da saúde e etc.) prestarão contas ao Arquiteto do Universo pelo
descumprimento do preceito bíblico – amar o próximo como a ti mesmo – devemos
exigir, também, que se cumpra a lei, pois não é possível que se trate as vidas
de pessoas como mais um negócio (muito rentável!), perpetuando-se indefinidamente
essa inglória ilegalidade. Isso tem que acabar!
As omissões e ações geram
conseqüências. Senão pela fundamentação principiológica (de valores, moral e
ética) a reparação desse mal deve ser equilibrada pela via legal, pois, pelo famoso
“deixa para lá” que os infortúnios acabam prevalecendo. Devemos exigir nossos
direitos, valendo ressaltar que, o desrespeito evidente da dignidade da pessoa
humana (princípio atemporal, imutável, universal e indisponível) com o outro
hoje poderá ser amanhã vivenciado por nós, numa qualquer dessas filas. O
problema é pontual, corriqueiro, grave e que todos nós devemos dar a devida
importância, pois, mude-se o que deve ser mudado!
São
Paulo, 26 de janeiro de 2010.
Adriano Augusto Fidalgo
Advogado. Especialista em Direito
Processual Civil pela Universidade São Francisco. Especialista em Direito
Tributário pela Escola Superior de Advocacia da OAB/SP.
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