sábado, 10 de maio de 2014

O CYBERBULLYING E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Vive-se na pós-modernidade, dentro da sociedade da informação, chamada por alguns de modernidade líquida, qual seja, época em que todas as relações são rápidas, com prazo de validade, fugazes, eis que a celeridade dos tempos e a fragilidade dos valores vividos assim estampam os relacionamentos do tempo atual.
            Não definirei o cyberbullying, mas em breve passagem, sendo o bullying, em linhas gerais, o ato de hostilidade, abuso e agressão que se provoca a outrem, por consequência, o cyberbullying é a prática de tais ofensas de modo amplificado, utilizando-se dos meios de mídia e tecnológicos à disposição, como internet, torpedos, celulares e etc. Nessa direção, desliga-se do mundo real e se adentra no virtual.
            A fase da “zoação” entre os jovens costuma se inaugurar entre os 10 a 14 anos. Mas, como sabido, no Brasil, ao menos, isso se estende até o período de ingresso dos universitários nos bancos das faculdades. Onde acontecem os chamados trotes, sendo fato as diversas humilhações já ocorridas em diversos incidentes, culminando até com a morte de calouros. Hoje, porém, isso ocorre até após. Trago de exemplo o caso Geyse Arruda, talvez um bulllying auto provocado que a levou a “fama”.
            Como fartamente noticiado são comuns a exposição de fotos de famosos nus sem (talvez) sua permissão (Scarlet Johansson e Carolina Dieckmann) e vídeos sexuais (a assessora parlamentar Denise Leitão Rocha inclusive fora demitida por isso). Assim como, de alguns casos emblemáticos que acabam surgindo, entre jovens, acerca de chantagens por fotos trocados entre ex namorados, invasão de perfis, relações ou exposições sexuais vazadas de webcams, perfis falsos e etc.
            A questão do bullying vem deixando marcas funestas na vida das pessoas. O caso da escola de Realengo é um exemplo clássico das consequencias do bullying e das repercussões traumáticas que podem gerar nas personalidades. Já se fala na inserção de câmeras dentro das salas de aula por esses e outros motivos comportamentais.
            Ainda pontuando-se que o bullying seja algo cruel em sua essência, o que se dirá do cyberbullying, onde os ataques podem ser feitos de distâncias inimagináveis, com autoria anônima, sem chance de defesa do agredido, além do fato do agressor sequer poder ver as reações humanas do ofendido, cessando qualquer chance de arrependimento ou reparação, ao ver a dor alheia, do que poderia ou se imaginaria ser uma brincadeira, mas que em verdade gera danos.
            Já se criou uma doutrina chamada de “the rigth to be let alone” (direito de ser esquecido), visando salvaguardar que a memória digital se torne algo perene. Quanto à rede de dados já há algo normatizado pela Comunidade Européia, conforme Directiva 95/46/CE, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados. Não é razoável que um jovem que errou no passado tenha maculada toda a sua trajetória futura por um lapso do pretérito.
            Os sistemas de dados foram feitos para beneficiar as pessoas e não para flagela-las. Recentemente o Estado Brasileiro quase levou adiante um projeto de cadastro único sobre todos os dados das pessoas, quais sejam: imposto de renda, clube que frequenta, dados bancários, onde o cidadão trabalha e etc. Imagina-se o quão isso poderia ser daninho ao ser mal usado? Isso até de fato existe por outros mecanismos, um big brother de dados ou informações que o Estado tem em seu poder. O que acontece inclusive de Estado contra Estado, no caso dos Estados Unidos contra o Brasil, conforme denúncia recente de espionagem deflagrada por Edward Snowden.
            Assim, do mesmo modo que é lícito as pessoas se exporem nas redes sociais, de outras frente também é totalmente lícito que se queira manter adstrita a individualidade, a vida privada, a intimidade, devendo ser resguardado o sigilo. Nesse sentido a justiça brasileira tem dado guarida aos que se socorrem ao verem seus dados veiculados de modo desautorizado. Inclusive concedendo liminares e até impondo multas diárias aos sites provedores de conteúdos.
            Para enfrentar o cyberbullying se utiliza como escudo os tipos penais da injúria, calúnia e difamação. Eis que não há normas específicas sobre o assunto ainda. Deve-se punir o agressor e evitar que a pichação e o linchamento público virtual ocorram. Quem transmite uma situação dessas, deixa de ser expectador e vira co-participe, sendo também merecedor da devida reprimenda.
            Concluindo, creio que invoco aqui como argumento novidadeiro, no que tange a esse assunto também relativamente novo, que a pedra de toque no assunto para proteger, evitar e conscientizar contra o cyberbullying seja o princípio da dignidade da pessoa humana.
Eis que, não é proporcional, honesto e pedagógico impingir a um ser humano uma pena eterna. Sequer pena de morte existe no Brasil! Trucidar a dignidade de uma pessoa, retirando seus traços de humanidade ao eternizar uma situação de falha ou patrocinar que uma agressão injusta se mantenha é reprovável. Preserva-se a dignidade da pessoa humana, concedendo a faculdade do exercício do direito de ser esquecido, quando assim se queira.


ADRIANO AUGUSTO FIDALGO. Titular da Fidalgo Advocacia. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade São Francisco. Especialista em Direito Tributário pela Escola Superior de Advocacia da OAB/SP. Pós graduando do MBA em Auditoria pela Universidade Nove de Julho.

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